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Introduzindo e concluindo a sociologia do conhecimento de Durkheim (1996 [1912])

Introduzindo e concluindo a sociologia do conhecimento de Durkheim (1996 [1912])

Síntese das principais idéias apresentadas por Durkheim na Introdução e na Conclusão de As formas elementares da vida religiosa.

Edição utilizada:
DURKHEIM, Émile. 1996. As formas elementares da vida religiosa. (Trad. Paulo Neves) São Paulo: Martins Fontes [1912]

A IDEIA DE “ELEMENTAR”
O elementar não é uma origem absoluta, apenas relativamente a uma evolução do simples para o complexo. Assim, as formas elementares da vida religiosa estão para as formas mais evoluídas como:

  • o simples está para o complexo
  • o primitivo está para o moderno/civilizado
  • o uniforme/homogêneo está para o diversificado/heterogêneo
  • o inferior está para o superior
  • o evidente/nu está para o oculto/vestido
  • o fácil de investigar está para o difícil de investigar
  • os elementos mais característicos de uma instituição estão para os menos característicos
  • o tosco/rudimentar/grosseiro está para o elaborado
  • a solidariedade mecânica está para a solidariedade orgânica

A mudança na concepção de evolução biológica causada pela descoberta de seres monocelulares é comparada com a proposição de uma concepção de evolução social a partir da ideia de que as religiões totêmicas australianas são as mais elementares: surpreender o segredo da vida no ser protoplásmico mais simples seria como surpreender o segredo da sociedade na instituição mais simples (p.458)

O POSTULADO ESSENCIAL DA SOCIOLOGIA
Uma instituição humana não pode repousar sobre o erro e a mentira, senão encontraria resistências insuperáveis e não duraria. Portanto, uma instituição humana deve ser fundada na natureza das coisas e em necessidades humanas.

INSTITUIÇÕES SÃO COMPOSIÇÕES DOCUMENTADAS DE CRENÇAS (ideias, representações) E RITOS (ações, práticas)
Nem necessidade física ou metafísica a priori (conceitos simbólicos lógico-racionais acessíveis pelas forças do espírito), nem experiência empírica direta individual (hábitos mutáveis acessíveis comportamentalmente), mas necessidade moral concreta acessível por observação histórica e etnográfica.

  • o que há de objetivo na ideia
  • símbolos bem fundados (na natureza das coisas)
  • artifício que segue de perto a natureza
  • obras de arte (nem artificial, nem natural)
  • imitação da natureza com perfeição crescente
  • conservação do poder específico da razão (transcender o empírico) sem sair do mundo observável
  • maneiras de agir (ritos) que surgem em grupos coordenados e que se destinam a suscitar, manter ou refazer estados mentais (crenças) desses grupos

A RELIGIÃO É A INSTITUIÇÃO SOCIAL ORIGINAL (a primeira a se desenvolver e a origem de todas as outras)

  • A ciência se origina da religião e difere dela apenas em grau, não em natureza.
  • Ciência e filosofia se originam da religião.
  • Quase todas as grandes instituições sociais nasceram da religião (a possível exceção é a economia) (p.462)

CRENÇAS (ideias) E RITOS (atitudes) QUE ESTÃO NA BASE DE TODAS AS RELIGIÕES

  • distinção das coisas entre sagradas e profanas
  • noção de alma
  • noção de espírito
  • noção de personalidade mítica
  • noção de divindade nacional/internacional
  • culto negativo (com práticas ascéticas)
  • ritos de oblação
  • ritos de comunhão
  • ritos imitativos
  • ritos comemorativos
  • ritos piaculares

AS CATEGORIAS DO ENTENDIMENTO
As categorias fundamentais do pensamento (logo a ciência) têm origem religiosa. O mesmo acontece com a magia e as técnicas dela derivadas (p.462).

As categorias do entendimento são:

  • noções essenciais que dominam toda a nossa vida intelectual
  • as propriedades mais universais das coisas
  • quadros sólidos que encerram o pensamento
  • inseparáveis do funcionamento normal do espírito
  • a ossatura da inteligência
  • hábeis instrumentos/instituições de pensamento laboriosamente forjados ao longo de séculos
  • capital intelectual humano acumulado
  • acúmulo de experiência e saber (produto) de uma imensa cooperação de uma multidão ao longo das gerações
  • representações coletivas

Exemplos de categorias elementares do entendimento:

  • tempo
  • espaço
  • gênero
  • número
  • causa
  • força
  • substância
  • personalidade
  • eficácia
  • etc.

O tempo como categoria do entendimento (tempo social) é:

  • um quadro abstrado e impessoal no qual todos os acontecimentos possívels podem ser situados
  • pontos de referência fixos e determinados indispensáveis em relação aos quais todas as coisas se classificam temporalmente
  • o tempo objetivamente pensado por todos
  • o calendário (dias, semanas, meses, anos etc.) que exprime e assegura a regularidade do ritmo da atividade coletiva (ritos, festas, cerimônias…)

O espaço como categoria do entendimento (espaço social) é composto por distinções (direita/esquerda, em cima/embaixo, norte/sul, leste/oeste) provenientes da atribuição de valores afetivos coletivos (comuns) diferentes a diferentes regiões do espaço, de forma que a forma/divisão/organização social seja o modelo da forma/divisão/organização espacial e esta seja o decalque daquela.

Exemplos de categorias NÃO fundamentais do entendimento (não são encontradas nas religiões elementares):

  • contradição
  • identidade

HOMO DUPLEX (ser social e ser individual)
A ação do ser social ultrapassa a do indivíduo pois não se reduz à utilidade. O pensamento do ser social ultrapassa o do indivíduo pois não se reduz à sua experiência direta. O ser social ultrapassa o indivíduo para o bem (fortalece indivíduos normais) e para o mal (pune indivíduos desviantes).

O ser individual está para o ser social como:

  • a parte esta para o todo
  • o simples está para o complexo

MONOCAUSALISMO SOCIOLÓGICO
Para cada efeito sua causa (sempre uma única causa para cada efeito). Se a sociologia explica as formas elementares da vida religiosa, então também explicará as formas mais evoluídas (p.458)

A SOCIEDADE É A CAUSA DE QUALQUER EFEITO SOCIAL

  • A sociedade é a causa objetiva, universal e eterna da experiência religiosa (p.461).
  • A sociedade é a fonte da ação religiosa (p.462)
  • O que foi feito em nome da religião não foi feito em vão (p.463).
  • A sociedade ideal supõe a religião, não a explica (p.464).
  • A religião é a imagem da sociedade e reflete todos os seus aspectos (p.464)

SOCIEDADE É AÇÃO COLETIVA

  • a sociedade só pode fazer sentir sua influência se for um ato, e só será um ato se os indivíduos que a compõem se reunirem e agirem em comum. É pela ação comum que a sociedade toma consciência de si e se afirma; ela é, acima de tudo, uma cooperação ativa.
  • As ideias e os sentimentos coletivos só são possíveis graças a movimentos exteriores que os simbolizam (p.461-2)
  • Sociedade é ação (p.462)

O RITO/CULTO (prática) É A PROVA EXPERIMENTAL DA CRENÇA (teoria): pré-história de uma sociologia dos afetos

  • O conjunto de atos regularmente repetidos que constitui o culto é a repetição de atos com o objetivo de renovar os seus efeitos, o conjunto dos meios pelos quais eles se criam e se recriam periodicamente (p.460)
  • O sentimento de alegria, paz interior, serenidade, entusiasmo do fiel não pode ser puramente ilusório (p.460)
  • Sentimentos coletivos só podem tomar consciência de si ao se fixarem em objetos exteriores na forma de sentimentos objetivados. Sentimentos coletivos ganham assim uma existência objetiva e podem ser confundidos com o mundo objetivo, sendo na verdade uma instituição social (p.462).
  • As manobras materiais da mecânica mística e da técnica religiosa não passam do invólucro externo sob o qual se dissimulam operações mentais, visando atingir, tonificar e disciplinar consciências (p.463).

A VERDADEIRA FUNÇÃO DA RELIGIÃO É O FAVORECIMENTO DA AÇÃO

  • A verdadeira função da religião não é nos fazer pensar, mas sim nos fazer agir, nos ajudar a viver. O fiel que se pôs em contato com seu deus não é apenas um homem que percebe verdades novas que o descrente ignora, é um homem que pode mais (p.459)
  • Forças religiosas são forças humanas/morais.
  • Mesmo as forças mais impessoais e anônimas não passam de sentimentos coletivos objetivados (p.462)
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